sexta-feira, agosto 06, 2004

Um Sinal de Esperança

Artigo da autoria de Eduardo Torres

Há dias, num dos blogues, alguém perguntava porque é que o Sporting esteve tantos anos (dezoito) sem ganhar nada mas não perdeu espaço e prestígio na Comunicação Social? Não me lembro quem é que fez a pergunta mas, o certo é que a considero bastante interessante. E poderia até acrescentar: e porque é que o F.C.Porto esteve duas décadas apagado, e depois chegou onde tem chegado?

O caso do F.C.Porto tem uma especificidade, que de algum modo lhe facilitou muita a vida, a partir do momento em que a soube explorar: é o maior clube do Porto. E, a partir do momento em que alargou a dinâmica desse conceito para o de maior clube do Norte, tem um espaço de captação de adeptos, com tudo o que isso implica, que é justamente o que o Benfica e o Sporting nos tiram.

A partir do momento em que encontrou dirigentes competentes, e que encontrou uma estratégia de empolgamento (às vezes excessivo) dos seus, afrontado Benfica e Sporting, em lugar da aceitação tácita da inferioridade, como acontecera em alguns dos anos anteriores, despertou sinergias extraordinárias. Consegue manter sempre o seu orgulho vivo e o(s) seu(s) dirigente(s) nunca deixa passar em claro qualquer beliscão, leve que seja (ou até meramente suposto), sem defender intransigente e apaixonadamente o seu clube. Noutras questões, não entro. Nem nunca explicariam tudo. Se me perguntarem se “o” gostaria de ter como amigo, respondo claramente que não. Mas só isso…

E o Sporting? Porque não se ressentiu ele, nomeadamente em termos de projecção na Comunicação Social, como aconteceu com o Belenenses? As razões são várias, e não temos a insensata pretensão de as conhecer todas. No entanto, aqui ficam algumas:

* O decaimento do Belenenses começou no início dos anos 60. O Sporting teve a sua grande crise nos anos 80 e 90. Essa diferença, permitiu que o Sporting pudesse passar mais pujante os anos em que se iniciaram e popularizaram as competições europeias, em que a televisão passou a levar e a repetir imagens, em cada vez maior quantidade, popularizando acrescidamente os clubes que disso beneficiaram. Assim, aquele clube ganhou uma implantação e solidez que lhe permitiu resistir com mais facilidade às tempestades que vieram. Pelo contrário, o Belenenses (a viver o “drama” do Estádio) não conseguiu dar o salto para marcar presença distinta em termos europeus; e a expansão da Comunicação Social, nomeadamente da televisão, tem vindo no sentido inverso ao da capacidade de afirmação do clube. Assim, cada ano que passa, mais espaço perdemos.

* O Sporting sempre se manteve numa postura orgulhosa e altiva – às vezes arrogante; nós, em parte por maior humanidade, em parte por perda de referências, fomos aceitando um estatuto subalternizado, até ao ponto em que é mal visto quem se revolta contra essa atitude, hoje já muito enraizada no subconsciente. Tão enraizada, que já nem os próprios se dão conta de que existe e que a estão a alimentar.

* Os adeptos do Sporting, como os de outros clubes, nunca se coibiram de fazer a propaganda explícita mas, sobretudo, a implícita (isto é, a que se oculta na aparência de neutralidade, e que é a mais eficaz de todas; aliás, como outros agentes desportivos…), dos seus clubes; os do Belenenses, que tiveram ou têm lugares de destaque, nomeadamente na Comunicação Social, pois é tal que principalmente me refiro, são muito mais contidos nisso. Sempre foram. Em parte, por um pudor que só lhes fica bem. Noutra parte, em especial nos dias que correm… não percebo porquê!

* O Belenenses, durante muitos anos, tinha muito pouca gente de “classe média”. Tinha uma aristocracia (verdadeira, isto é, de mérito, ou de simples fachada) e adeptos de classes populares, gente humilde… Ora, desde há décadas que é a classe média – mais culta e diligente – que empurra as coisas, exerce pressão, cria ideias predominantes.

Não vejo o futuro do clube nada facilitado. Os horizontes não estão nada prometedores, e haverá barreiras muito difíceis de superar, por mais competentes que possam ser os dirigentes. Só quem estiver conformado pode olhar para o futuro sem ver que há imenso por fazer…

Repito aqui o que escrevi há tempos atrás: “Em breve virão campeonatos europeus. Com várias divisões e, depois, com algo de semelhante aos nossos actuais distritais, que serão os campeonatos só nacionais. Há 40 anos atrás, aspiraríamos à 1ª Divisão europeia; há 15 anos atrás, à 2ª Divisão. Agora, corremos o risco dos “distritais” (i.e., nacionais). Temos uma década, ou talvez menos, para dar o salto...ou não. Se o não dermos, corremos, sim, o risco da atleticização. Pode parecer uma loucura, um pessimismo detestável, mas olhem que há mais quem veja este risco. E com mais conhecimento de causa! Mas não sejamos derrotistas e pensemos em soluções!”.

Como é óbvio (?), essas soluções não são, não podem ser as de carácter imediatista.

No entanto, há pelo menos um ponto que nos abre uma porta de esperança. No Belenenses, todos são bem vindos, desde o mais poderoso ao mais humilde. Pessoalmente, sinto-me melhor no meio de pessoas genuínas, ainda que às vezes de expressão mais rude, do que no meio do verniz de certas pseudo élites. Mas penso que é importante, e pode trazer uma nova capacidade, o facto de muitos dos filhos daquela gente humilde das primeiras décadas do Belenenses terem entretanto chegado a uma, digamos, classe média, em termos de cultura, de conhecimento do mundo, de know-how, de capacidade de se mexerem. E os blogs belenenses, que se distinguem a léguas, em termos de qualidade, dos de outros clubes (e digo-o sem receio de ser parcial) são um exemplo e sinal iniludível disso mesmo. Um sinal de esperança!

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