quinta-feira, dezembro 29, 2011

Vistas curtas

Blog do Belenenses: Luciano Rodrigues
Há episódios que vão explicando como o nosso Belenenses chegou a esta ponto. Eu gosto particularmente de atender aos pequenos pormenores, muito longe dos holofotes dos milhões e dos craques que se transformam em futebolistas de praia. Nestes pequenos pormenores, é mais fácil "conhecermos" as pessoas, a sua auto-confiança e a sua visão.

Em Maio de 2007, a 2 ou 3 dias da Final da Taça de Portugal, burburinho no "corredor da Direcção". No centro o Presidente, em seu redor duas ou três pessoas, com responsabilidades, a saber se haveria autocarro aberto e decorado para transportar a equipa de regresso ao Restelo em caso de vitória.

Como a resposta foi, naturalmente, afirmativa, contra ela começaram a esgrimir argumentos tão incríveis quanto ter o autocarro em stand-by "ir dar azar" ou "pagar-se mesmo em caso de derrota". O preço de ter o autocarro de prevenção, em caso de derrota, "pagava-se" com meia dúzia de bilhetes para a Final, diga-se. E ainda houve uma mente iluminada que decidiu perorar sobre as poucas hipóteses que tinhamos de vencer.

Uma pequena história que mostra tanto sobre o porquê de estarmos onde estamos.

Renascer é preciso

Blog do Belenenses: Luciano Rodrigues
Regresso à blogosfera azul porque não aguento mais. Nos últimos anos, “conseguiram” afastar-me do Restelo, mas ninguém me consegue fazer deixar de continuar a sofrer, e como temos sofrido nos últimos anos. E regresso neste momento porque considero que começa a não haver qualquer vergonha no nosso clube. Não tenho, como nunca tive, quaisquer pretensões ao que quer que seja no clube. Enquanto tive a honra de o poder servir, dei sempre o meu melhor, mas quem me conhece sabe bem que o que mais desejava, jogo após jogo, era poder estar na bancada a puxar pela equipa, a invectivar adversários, pressionar árbitros e celebrar golos.

“Manual Prático de Destruição de um Clube”: este poderia ser o título de um livro da autoria do Belenenses em que, em 100 páginas com letras grandes e alguns bonecos, se explica sem tirar nem por de que forma se pode destruir um clube histórico, grande, multifacetado e apaixonante. Não, o declínio não começou há 3 anos, como é óbvio. Começou há muitas décadas atrás, de forma lenta, gradual e inevitável, dadas as contingências externas com que nos fomos deparando e algumas decisões menos acertadas nesse trajecto. Ainda assim, a pujança, a grandiosidade, a mística do nosso Belenenses era tão grande que nem esse declínio, nem períodos mais difíceis, superados por Homens de valor que tomaram as rédeas, conseguiram um efeito tão impactante como estes 3 anos.

Tudo começou com um Presidente que pediu 5 milhões emprestados, se enfiou no gabinete a ver DVDs entregues por empresários e comprou um plantel por catálogo, liderado por um “treinador fantoche”. Os milhões voaram e 3 meses depois haveria de desaparecer com a mesma velocidade com que tinha aparecido e, piéce de resistence, garantindo não voltar a por os pés no Restelo. Depois haveria de vir outro, que tinha dinheiro garantido para resolver os problemas de tesouraria, que era o homem certo na hora certa e que assim que lá chegou, descobriu que dinheiro nem vê-lo, o acordo tinha sido de aperto de mão e o investidor não foi homem de palavra. Ah, caramba, que azar que tivemos, que isto de negócios de milhões vai lá de aperto de mão! Por fim, uma Direcção que estava dentro da realidade e se recandidata, avisa que não tem um tostão e é eleita e uns meses depois descobre que é preciso dinheiro e que se houver quem apareça com dinheiro, são convocadas novas eleições…

Não falei propositadamente de João Almeida, que ficou mais famoso pela sua saída do que pela sua reconhecida e inegável paixão pelo Belenenses, bem como a capacidade de liderança que lhe continuo a reconhecer. Se compreendi a sua saída, no sentido estritamente pessoal e profissional, como é óbvio não a aceitei enquanto Belenense. E tive a honestidade de dizer exactamente isto, quer publicamente, que a ele mesmo. E serve esta introdução para dizer que a sua saída, quando uma larga maioria de Belenenses viam nele a personificação de sangue novo e um novo alento, foi mais uma machadada na dinâmica do nosso clube.

Falo em João Almeida porque foi a única pessoa que nos últimos anos esteve na esfera de poder do clube com quem tive a possibilidade de partilhar aquela que é a minha visão para o futuro do clube: ou aparece um investidor com capacidade para desafogar a tesouraria do clube (nesta solução concordamos todos... ou não) ou tem de se optar por uma via radical, dolorosa, muito dolorosa, mas que me parece a melhor solução para um clube que a prazo está condenado a morrer se continuar nesta senda de autoflagelação: Renascer.

Renascer explica-se de forma muito simples: aceitar a incapacidade que temos para fazer mais do que adiar o funeral do clube e aproveitar os dois grandes activos que restam ao clube antes que os degrademos mais ainda: um nome de peso e um terreno de valor inestimável. Aceitar que um clube se faz de vitórias e derrotas, e o caminho faz-se caminhando, pelo que muitas vezes é necessário darmos vários passos atrás para que se possa voltar a caminhar em frente e coleccionar mais vitórias, que derrotas.

Seria preciso parar, o tempo que fosse necessário, caír para que divisão fosse, encetar contactos, estabelecer parcerias, sabendo que as nossas dívidas se pagam com uns cantinhos dos terrenos do Restelo, e recomeçar tudo do zero. Nesta altura, sei bem, uma grande maioria dos leitores começam a duvidar da minha sanidade mental. Mas acreditem que é isto que eu sinto e acredito nesta solução. Para que uma solução deste tipo fosse implementada, era precisa uma equipa de pessoas com capacidade de Liderança, Visão, Sagacidade e, acima de tudo, Coragem. Uma equipa de gente capaz de ver além do dia de amanhã e que saiba respeitar os sonhos dos Rapazes da Praia. Sabendo que seriam precisos anos, eventualmente décadas, para reaproximar desportivamente o clube daquilo que ele já foi. Mas lá está, é precisa gente que veja para além do dia de amanhã.

Penso nisto sempre que oiço o meu filho, com dois anos e meio, a gritar a plenos pulmões que é do Belém. No fundo, só queria que daqui a 20 anos o meu filho pudesse conhecer um Belenenses respeitável e capaz de respeitar a sua história. Mas duvido que venha a acontecer.