sexta-feira, agosto 27, 2004

PALAVRAS QUE FORAM DITAS 16: Augusto Silva e o Quarto de Hora à Belenenses


Augusto Silva é certamente uma das maiores figuras de todos os tempos do nosso Belenenses, quer como jogador, quer com treinador. Deixou também uma marca indelével na selecção nacional, que representou por 21 vezes, 8 das quatro como capitão. Brilhou a grande altura nos Jogos de 1928, com o seu querer extraordinário, que lhe valeu o epíteto de “Leão de Amsterdão”. Sobressaiu, principalmente, na vitória por 2-1 conta a Jugoslávia, marcando o golo da vitória, e sendo levado em ombros. O seu número de internacionalizações foi o máximo português durante 16 anos, de 1934 a 1950.

Ao serviço do Belenenses, enquanto jogador, conquistou 3 campeonatos de Portugal e 4 campeonatos de Lisboa.

Mais tarde, como treinador, conduziu o Belenenses à vitória no Campeonato Nacional de 1945-46. Foi o primeiro treinador português a conseguir tal feito.

Aquando da sua morte, o também já desaparecido jornalista Vítor Santos, nas páginas de “A Bola”, escreveu o seguinte:

“Augusto Silva, o velho e glorioso ‘leão de Amsterdão, era um símbolo do Belenenses, um dos homens que contribuiu com forte quinhão para que o clube atingisse a posição que hoje ocupa no desporto português.

Jogador de excepcionais qualidades, tanto técnicas como de desportista, ele sabia, ainda, ser um lutador, sempre se entregando à luta com ardor e entusiasmo que definem e caracterizam os atletas de eleição, que sabem defender até ao extremo das suas forças a camisola que cingem no trono forte.

Quantas vitórias lhe devem o Belenenses e a Selecção Nacional! Quantas vezes ele galvanizou a equipa e, num ápice, a golpes de energia, transformava a derrota em vitória!

A minha geração é outra e o Augusto Silva, o ‘leão de Amsterdão’, apareceu a meus olhos não como um jogador – e, muito menos, como um jogador que tivesse de, profissionalmente, criticar – mas como um símbolo.

E um símbolo, não só do Belenenses – desse portuguesíssimo clube da Cruz de Cristo! – mas do futebol lusitano. (…) vi-o simbolizar o Belenenses, na sua camisola azul sangrada com a Cruz de Cristo. E vi-o simbolizar Portugal, nas qualidade rácicas que, ainda hoje, estão a dar ao futebol lusitano a indicação para o caminho de um estilo próprio e diferenciado.

O último quarto de hora, que foi orgulho inconfundível dessa gente de Belém, apareceu sempre a meus olhos com o Augusto Silva a parar os ponteiros do relógio, transformando a derrota em empate ou vitória, com os seus alardes de valor, de técnica, de temperamento, de ralé, de ‘raça’ belenenses, que o tempo não apagou mas – porque não dizê-lo? – ensombrou um pouco, quando o futebol deu o salto de um diletantismo regional ou bairrista para um profissionalismo que, mal compreendido, fez enferrujar as mais gloriosas tradições”.

E já agora, a propósito do famoso (noutros tempos) “quarto de hora à Belenenses”, de que Augusto Silva foi o expoente maior, a sua alma iniciadora, inserimos aqui um pequeno mas significativo texto que, sob a epígrafe AMOR À CAMISOLA, Acácio Rosa fez sair num dos seus livros:

“Todos os belenenses da ‘velha guarda’ sabem o que foi o ‘quarto de hora’. A equipa podia estar a perder por três ou quatro tentos que o adversário, por muito que fosse, não se considerava seguro enquanto não soava o apito final. E quantas derrotas tidas quase como certas se transformaram em magníficas vitórias, no curto espaço de minutos! Uma das vitórias, lembram-nos bem, foi [contra] o Benfica; jogava-se para o torneio lisboeta, nas Amoreiras, e, ao quarto de hora [isto é, a um quarto de hora do fim], os rapazes de Belém perdiam por 4-1, afigurando-se que o assunto estava arrumado. Mas a reviravolta operou-se num ápice e no final havia 5-4 a favor do Belenenses.

O entusiasmo de toda a gente de Belém que presenciava o jogo, bem como o assombro e o espanto dos benfiquistas não se descrevem.

Daí por diante, o ‘quarto de hora belenenses’ passou a ser temido e é pena – sem desprimor para os jogadores actuais – que já não o seja”.

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