quarta-feira, junho 16, 2004

Década de 80 - Parte 1 - O desastre e o regresso



Os anos 80, que nos trouxeram a grande tristeza da primeira descida, também nos trouxeram uma 2ª metade com algumas boas alegrias. Foi uma década estranha, um dos pontos charneira da história do Belenenses. Por isso, farei no final uma série de comentários e reflexões que não têm a ver directamente com boas ou fracas assistências e sim com pontos fundamentais onde se cruzam o passado e o futuro do nosso clube, e as grandes opções (muitas delas, más, na minha opinião) que já se tomaram (por acção ou omissão) e as que ainda se podem tomar no futuro. É por esses futuros possíveis que tais reflexões podem ter importância, visto que no que diz respeito ao passado… já não o podemos modificar.

Quanto a grandes assistências, começo por lembrar o último jogo na 2ª Divisão (época 83/84), a festa da subida: não posso precisar, mas acho que estariam entre 30.000 e 35.000 pessoas e tudo belenenses. Perdemos 1-2 contra o União da Madeira mas a subida já estava garantida de qualquer forma (desde o jogo anterior, em Sesimbra, onde os adeptos do Belenenses, no fim do jogo, invadiram pacificamente o relvado para festejar. Nessa época, grande multidões de belenenses deslocavam-se para assistir aos jogos fora de casa). Para mim, ainda com o orgulho da noção do Belenenses como 4º grande, foi uma festa com algum sabor a humilhação, embora pusesse fim a um pesadelo que, na altura, pensávamos que não se repetiria (andar por uma divisão inferior) mas que, infelizmente, já aconteceu mais duas vezes e que este ano esteve quase, quase a acontecer novamente, como todos ainda nos lembramos.
Na altura em que descemos pela 1ª vez foi um desgosto imenso. Acontecera o impensável! Já tínhamos tido um ou dois sustos em épocas anteriores mas sempre o peso das camisolas azuis e o brio dos jogadores, treinadores e responsáveis dava a volta à situação. Mesmo com o clube falido, a ponto de nem haver camisolas para trocar se uma se rasgasse, nem produtos de farmácia… não pensávamos que pudesse suceder! Na altura ninguém podia objectivamente pôr em causa o nosso estatuto: só quatro clubes tinham sido campeões e nós éramos um deles; só quatro tinham estado sempre na 1ª Divisão, e nós éramos um deles (e sem favores, coisa de que o Porto não se pode orgulhar: há mais de 60 anos, julgo que em 41/42, mas pode ter sido em 39/40, aumentou-se o número de participantes no campeonato por causa deles…); nenhum outro clube podia comparar-se com nós em número de adeptos e popularidade, excepto o restante trio; nenhum outro clube, além de nós e esses três, tinha tido figuras míticas do futebol português e pergaminhos como de ter o 1º estádio relvado de Lisboa; ninguém tinha o privilégio de nomes especiais e populares, como “pastéis”, junto com “lampiões”, “lagartos” e “andrades”; havia os vermelhos, os verdes, e os azuis, que éramos nós! Então, não era o Porto o “azul”? Não senhor: eram azuis e brancos. Azuis mesmo, eram os “pastéis”! Depois, integrávamos aquelas expressões populares, demonstrativas do peso que tínhamos, como, por exemplo, “ter um olho à Belenenses”. Quando descemos, isso estava na 1ªpágina de todos os jornais, e não falo só dos desportivos, mas também dos generalistas. Foi um acontecimento que provocou sensação no país. Já condenados, assistimos à vitória por 2-1, no último jogo dessa tristíssima época de 1981/82, salvo erro contra o Estoril. De lágrimas nos olhos, ainda incrédulos, nem querendo pensar se aquela podia ser uma despedida para sempre. Como alguém escreveu, acho que na “Bola”, quando marcámos o 2º golo, embora de nada valesse para evitar a despromoção sentenciada na jornada anterior, o nosso brado de honra e de raiva ouviu-se na outra margem do Tejo!
No meio da tristeza da 2ª Divisão, uma alegria que demonstrou que não tínhamos morrido: duas Taça de Andebol, uma no ano da descida, a outra no ano da subida! No ano do regresso à 1ª divisão (84-85), também no andebol, mais um título nacional. A vitória no campeonato foi garantida no Pavilhão da Luz. Tínhamos que ganhar ao Benfica e ganhámos! Não vi o jogo mas ouvi contar que os “lampiões” tinham a festa preparada, até se viam passar garrafas de champanhe… mas a vitória foi nossa! (Já agora, voltando ao futebol, lembro que em 59-60, além da vitória na final da Taça contra o Sporting por 2-1, e de uma vitória por 5-0 sobre o Benfica na final da Taça de Honra, estragámos uma festa ao Benfica, no último jogo do campeonato: eles já tinham preparado umas faixas a dizer “campeões invictos”. Mas o Belém ganhou esse jogo na Luz por 2-1, com um golo de Matateu, segundo se diz, de um ângulo incrível. E eles foram campeões sim, mas não invictos, caindo as faixas no ridículo. Uma pequena desforra do campeonato que em 54-55 perdemos a 4 minutos do fim…).
Na época 84-85, então, estávamos de volta à 1ª Divisão. No primeiro jogo, contra o Vitória de Setúbal, éramos umas 20.000 pessoas, ou um pouco mais, para festejar o regresso ao nosso lugar. Aí, sim, chorei de comoção, ao voltar a ver aquelas nossas camisolas, este azul que nos enche a alma, na 1ª divisão, de onde nunca devíamos ter descido. Empatámos 2-2 mas estivemos a perder 2-0 até bem perto do fim. Foi quase um último "quarto de hora" à Belenenses, que fez história noutros tempos (será que os actuais jogadores sabem o que isso era, já alguma vez ouviram falar disso? Não sei, mas sinceramente receio bem que não! E é pena…).

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