terça-feira, maio 04, 2004

Pois se eu era pequenote...

Artigo da autoria de Manuel Benavente:

Pois se era eu um pequenote, nos idos de cinquenta, como é que o Di Pace não havia de fazer parte do meu imaginário?

O grande Augusto Silva, o leão de Amesterdão de vinte e oito e treinador dos campeões de quarenta e seis, era vizinho da minha avó – como está dona Maria Eugénia? -, o Sério morava lá em baixo também na Rua das Mercês, onde depois de ele sair veio a ficar uma grande ciganada, o Serafim das Neves era o que restava das altivas Torres de Belém e só me fazia um bocado de confusão o Capela andar cá e lá na Académica, enquanto o Zé Pereira dava os primeiros passos.

Sebastião Lucas da Fonseca, o nosso Matateu, começava a conhecer os cantos das ruas da Ajuda e Belém, enquanto o mano Vicente Lucas, alcunhado à chegada a Lisboa de Matateu Segundo, afirmava na Rocha do Conde de Óbidos: chamo-me Vicente. E foi mais coisa menos coisa por aqui que eu, depois de comprar três rebuçados da bola na leitaria do Gaudêncio, vim a saber que o Miguel Di Pace viera com mais dois craques argentinos - Perez e Benitez - assentar arraiais entre o meu triciclo e a bola de borracha que numa tarde de sábado furei com uma sovela, só para ver o efeito.

Diziam o meu pai e o meu tio, que me levavam para as Salésias aos domingos, felizes por me pegarem o Belenenses, que o Di Pace era um excelente tecnicista com grande visão de jogo, mas o melhor elogio que lhe posso fazer é lembrar que, para mim, na colecção dos bonecos da bola, que eu levava no bolso do bibe para a escola da Junta da dona Mariazinha, era um difícil que valia uns cinco à troca e eu não o jogava nunca no par ou ímpar!

Ou não tivesse ele vindo das pampas por aí acima na hora agá, ajudar o Matateu a ser Matateu, o tal que, meus amigos, numa fracção de segundo explodia em plena área, fintava dois, três defesas num palmo de terreno e fazia golo!

Estou certo que se hoje vir o Di Pace, continua a ser aquele rapaz franzino, de cabelo ondulado, risco ao lado, com ar de quem não parte um prato, mas que logo endossa de bandeja a bola ao nosso Matateu, que esse sim parte a loiça toda !

Pois para o Miguel Di Pace, aqui vai um grande abraço de um puto de cinco anos para um craque de vinte e cinco !

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