quinta-feira, maio 27, 2004

E agora Belenenses?



Depois daquela difícil tarde para todos nós belenenses, que marcou o termo do campeonato de futebol, em que perdemos o jogo, ganhámos a manutenção, mas desgraçadamente não salvámos a face, impõe-se fazer a pergunta em título.
Somos um simples adepto, que se senta na bancada e que vibra com a pátria belenense. Vemos um jogo de futebol com os amores e desamores que todos nós emprestamos aos palcos em que nos movemos. Mas nem por isso nos demitimos de procurar fazer uso da razão e perguntar: porquê?
Para tal há que pegar em várias pontas, desafiando-nos a nós próprios a não recorrer ao estratagema que Alexandre usou para desfazer o célebre nó.
Convém lembrar que vivemos o tempo do negócio do futebol. Sendo tempo de crise, há que geri-lo com pinças e bisturis. Mesmo internacionalmente, todos sabemos que o futebol em termos de lucros é uma fraude.
As sociedades anónimas desportivas praticamente impostas pela lei, em nome da transparência da informação, tornou a vida dos clubes de futebol, todos eles em estado de falência pelo menos técnica, ainda mais difícil. E mais difícil, porque houve que criar uma nova estrutura - bem sabemos que mais ou menos virtual -, mas que nem por isso deixou de concorrer para o incremento dos custos da organização.
Procuraram os clubes, cada um a seu modo, conviver o melhor possível com a nova realidade, e como não há soluções perfeitas, uns acumularam a presidência do clube com a da sociedade, outros optaram por se distanciar, outros ainda colocaram pessoas da sua inteiríssima confiança na Sad.
Como tantos outros clubes, guia-se o nosso Belenenses em termos de orçamento por um nome: Bingo. Não tenhamos dúvidas: hoje por hoje, é o Bingo o alfa e o ómega de muitas das organizações desportivas que, país fora, vendem as ilusões que muitos de nós, orfãos de afectos, compramos a qualquer preço.
Está pois a Sad do clube condicionada na sua actividade de “compra, venda e aluguer”, às receitas do jogo que a montante lhe chegam. E temos pois de compreender as opções conservadoras que os responsáveis muitas vezes têm de fazer e que acabam por conduzir ao desgaste inexorável dos planteis.
Também na hora da partida nem todos os clubes partem do mesmo local e ao mesmo tempo. Quer dizer: um clube de futebol não depende apenas dos seus adeptos, como seria natural, e nuito menos dos seus investidores privados. Sendo a economia portuguesa tradicionalmente dependente do investimento público, o futebol não foge à regra. E assim, estamos à mercê dos padrinhos que apanhamos pela frente, não sendo normalmente nas grandes cidades que vemos os maiores e mais escandalosos investimentos públicos em clubes de futebol.
Depois há as opções que se fazem dentro do negócio do futebol e só raramente se lida com gente que não precisa de papéis para cumprir a sua palavra, porque pessoas há que abandonam o barco fazendo cumprir contratos leoninos e tornando fraca a forte gente.
Em meia dúzia de linhas decerto não desapertámos, mas pelo menos concorremos para desapertar o tal nó górdio.
E para que não nos aconteça como à mulher de Loth, olhemos em frente e venha daí uma nova Sad, agradecendo a quem lá esteve esta época a disponibilidade e dedicação. Mas uma nova Sad com um mínimo de independência. E uma Sad e um clube que apostem também nos lugares de decisão, pois é na Liga, nas Associações e na Federação que nos podemos dar aos outros. E quanto mais importantes os outros forem para nós, seremos também mais importantes para eles.
Do grupo de jogadores que sem dúvida este ano viveram momentos amargos, mas que também não se mostraram capazes de melhor, conservemos um pequeno núcleo e com a parcimónia que o orçamento impõe, partamos com realismo, à “descoberta do encoberto”. A renovação de uma equipa de futebol é um trabalho diário, que começa na formação, mas que se cumpre pontualmente , com entrega, competência e também sorte (porque não dizê-lo?) na aquisição deste, ou de outro jogador.
Dos treinadores de futebol, temos obrigação de conhecer o suficiente para saber que são homens, a quem se deve pedir apenas competências – ética e técnica -, para gerir o dia a dia de um plantel de vinte ou trinta jogadores, o que sendo já muito é nada mais. Sobre os corpos sociais que dirigem o nosso clube, pensamos que há um consenso generalizado sobre a sua dedicação, o seu desapego a mordomias, a sua competência.
O nosso Belenenses como tantos clubes, uns maiores, outros bem mais pequenos, tem sido berço de verdadeiras dedicações, amando quantas vezes sem ver a quem. Nomes como Acácio Rosa, Gouveia da Veiga, Correia da Fonseca ; nomes como Artur José Pereira, Pepe, Matateu ; homens sem nome, anónimos, como o mais humilde seccionista, da mais humilde secção.

E agora Belenenses?
Há que olhar para o alto com os pés bem assentes na terra.
Porque a grandeza é apenas uma medida.
A fé sim, não tem bitolas. Nem fronteiras.

Sem comentários: