Depois de termos visto, nos três artigos anteriores, os grandes problemas fundamentais emergentes durante os anos 80 (esfriamento da paixão clubística, perda de identidade, falta de ambição e orgulho), vamos concluir estas reflexões com alguns outros problemas e, também, com a referência aos aspectos bons que a mesma década teve.
Entre os problemas, eu gostava de destacar a estagnação ao nível das instalações. Fez-se pouco. As piscinas continuaram paradas. O estádio recebeu as primeiras cadeiras (nos sócios com lugar cativo) a meio da década, a melhoria da iluminação imposta pelo regresso às competições europeias, algumas obras nos balneários… e pouco mais. Sobretudo, muito pouco para uma década inteira. O espaço do Restelo tinha muitas vezes um aspecto desleixado, quase desolado, estranhando eu porque, ao menos, não se limpavam certas zonas. Neste contexto, é justo destacar o que se fez nos últimos anos. Sequeira Nunes e Cabral Ferreira estão de parabéns! O complexo desportivo actualmente existente no Restelo, com a ampliação, renovação e atenção que lhe foi dada, é um património magnífico – para o Belenenses, para a cidade, para o país. O clube tem hoje 7.000 pessoas a praticar desporto…é obra! Um motivo de grande orgulho!
Também não houve, na 2ª metade da década de 80, uma correcta aposta na formação. Tome-se o exemplo do futebol: tirando Rui Gregório (que pode ter passado ao lado de uma grande carreira…), praticamente mais ninguém chegou a jogar com um mínimo de regularidade na equipa principal. Vale a pena aqui lembrar que, no ano terrível de 1982, Acácio Rosa trouxe Carlos Queirós para coordenar as camadas jovens do clube, em termos financeiros muito vantajosos para o Belenenses. Foi, posteriormente, dispensado! Não estou a endeusar Carlos Queirós – nunca o fiz, nem sequer é figura que me seja especialmente simpatia – mas tal dispensa foi uma decisão muitíssimo infeliz!
Outro aspecto, que já referi em anteriores artigos, foi a despreocupação com a diminuição das assistências, que já se começava a notar. E, aqui, faço um parêntesis para me congratular por – finalmente!!! – o assunto estar na ordem do dia e a merecer a atenção que a importância e a urgência do problema justificam. Ainda há três meses, quando neste blog comentei que aumentar as assistências era talvez a maior prioridade para a nova época, recebi uma resposta irónica! Ainda bem que pessoas como o Nuno Gomes e o Pedro Patrão insistiram e “obrigaram” a que o tema fosse mesmo objecto de atenção séria. Claro que, na década de 80, as assistências no Restelo deviam ser, em média, 3 ou 4 vezes superiores às actuais (veja-se fotos dos “Momentos” e outras publicadas nesta série de artigos). Mas eu já notava o problema que se ia gerando.
Lembro-me de, em conversas nos treinos, perguntar porque não se distribuíam convites aos jovens das escolas, sobretudo as das zonas envolventes de Belém; porque nos jogos europeus, ocasião privilegiada para projectar o clube, se punham preços tão caros e proibitivos; porque não se reduziam proporcionalmente os preços dos bilhetes para as bancadas inferiores do estádio, para este não parecer vazio (e permitir a presença de pessoas com menos posses); porque não se apoiavam mais as claques (na altura, só uma) e não se colocava gente azul em lugares que precisavam de ser animados, etc, etc, etc. Deparava-me com uma total indiferença… Hoje, o resultado dessa indiferença está à vista. Foi preciso esperar quase 20 anos para se tomarem medidas. Medidas que hoje serão bem mais penosas: era muito mais fácil atrair público quando o Belenenses tinha jogadores como um Mladenov, ganhava a Taça de Portugal, andava nas competições europeias, estava no pódio do campeonato… (devo contudo referir que as assistências, no Restelo, quando aumentam é menos por causa de boas classificações e sim, principalmente, por se “puxar” pela alma, pela garra, pela raça do clube. Gostava de enfatizar este ponto!)
Finalmente, quero referir um certo novo riquismo que então se instalou no Restelo. Tomaram lugar alguns dirigentes de plástico, tão preocupados com a sua imagem como despreocupados com a do clube. Noutro artigo, mencionei a ausência de reacção de certos dirigentes quando o clube era atacado ou menosprezado; mas eram esses mesmos dirigentes que não se esqueciam de reagir se a sua imagem pessoal era beliscada… De resto, vem a propósito referir os dias inteiros em que o Restelo parecia uma “quinta sem dono”. Parecia não haver por ali um único dirigente. Penso que, por vezes, faltou dedicação. Sei do que falo quando me refiro a dedicação graciosa. No entanto, se graciosamente não se consegue assegurar todo o constante acompanhamento contínuo de que o clube precisa, então, que se ceda ao pragmatismo, profissionalizando o que necessita de ser profissionalizado. E, então, tem que haver muito rigor e exigência de serviço!
Bom, mas os anos 80 também trouxeram coisas boas!
Em primeiro lugar, a capacidade de o clube ressurgir da crise que o fizera cair na 2ª Divisão. Poderia ter sido um afundamento definitivo! O Belém reagiu como só os grandes sabem reagir.
Depois, houve, durante anos, até à conquista da Taça de Portugal, a construção coerente de uma equipa: a criação de uma espinha dorsal, mantendo-se o que era de manter, e melhorando-a todos os anos com 2, 3, 4 jogadores! Há que dar esse mérito a Mário Rosa Freire e, entre outros, a José Silva, Carlos Silva e Barcínio Pinto. É justamente o que, em meu entender, devemos fazer nos próximos anos. Temos esta época uma base de jogadores de muito razoável qualidade. As contratações de Amaral, Juninho, Zé Pedro, por exemplo, foram excelentes. Há que assegurar a manutenção dos jogadores que interessam (salvo se surgir alguma muito boa proposta de clube estrangeiro), ir acrescentando 3 ou 4 jogadores de verdadeira qualidade cada temporada (desde logo, claro, para as posições mais carenciados), acabar de vez com jogadores emprestados por nossos rivais, lançar progressivamente jovens vindos da nossa formação ou de um trabalho de prospecção, estabilizar um modelo de jogo (falei disso num artigo chamado “Perfis” e fico contente de ver o Carvalhal, em entrevista ao jornal do Belenenses, dizer isso mesmo). Assim, iremos “lá”; e espero que, contrariamente ao que aconteceu há 15/18 anos atrás, haja a ambição de chegar sempre mais longe!
Ainda nos anos 80, conseguiu-se uma boa fonte de receitas, com a sala do bingo. Pena foi que, durante anos, o clube se tenha encostado a isso, também nesse aspecto não procurando novas formas, meios adicionais, soluções complementares.
Também é de elogiar o ressurgimento do jornal do Belenenses, salvo erro em 1987. Anos depois, como se sabe, veio um interregno e só mais recentemente o retorno. Esperemos que, desta vez, para não mais parar e, sim, para se ampliar e melhorar sempre mais!
Termino aqui a longa alusão à década de 80. Os próximos artigos serão sobre a década de 70. Depois, virá um balanço final sobre o passado a que assisti e, em seguida, o direccionamento para o futuro!
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