quinta-feira, março 02, 2006

Anais e Sarah Moniz (triatlo) na Dez

Reportagem de Carlos Mariano (Texto) e Paulo César (fotos) publicada na revista Record DEZ em 28/01/2006

Anais e Sarah Moniz
Filhas do vento


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Vanessa Fernandes domina o triatlo português. Mas á sua sombra florescem as irmãs Moniz: Sarah e Anais, a campeã mndial de juniores. Nascidas em França, querem representar a diáspora em Pequim.

O caminho para Sevilheira está juncado de recém-construidos parques eólicos. As monumentais ventoinhas que colhem o vento destinado a produzir energia são o cenário ideal para encontrar Sarah e Anais Moniz: duas triatletas de percurso errante e destino longiquo: Pequim, em 2008. Objectivo assumido sem complexos e que, tendo em conta os seus sucessos – com a conquista do titulo mundial de juniores por Anais a merecer o maior destaque -, não parece assim tão distante para duas filhas da diáspora portuguesa.
“O nosso grande sonho é estar nos Jogos Olímpicos de Pequim, declara Sarah a mais velha, com 18 anos, matando qualquer rodeio à partida. Declaração de intenções partilhada por Anais, de 16, que interrompe o silencio tímido com que recebeu a reportagem da Record DEZ: “é o nosso sonho.” Um sonho que Sarah, à beira de completar o 12º ano, não sabe ainda se poderá repetir-se em 2012, afinal, o curso de gestão que pretende abraçar não deve compadecer-se de treinos tridiários, estágios e competição.

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Mas a história destas duas atletas tem de começar com a sua mãe, Alicia, ela própria a corporização dessa coisa universal de ser português. Nascida na Venezuela de pais madeirense, Alicia Moniz rumou à França para estudar. E, apesar de ter cursado Demografia Histórica na Sorbonne, em Paris, foi o desporto a verdadeira força-motriz da sua vida. Pelo caminho, Alice conheceu Bernard Verguet, jogador de volei, esquiador, ciclista e outro viciado no desporto. Tornou-se Alicia e, em Besançon, deu à luz Sarah e Anais.

Desde muito cedo, as duas meninas foram estimuladas a fazer desporto: equitação, atletismo, natação… tudo valeu para ajudá-las a entender aquela que, segundo os pais, é a lição de vida mais importante: a superação. Dos próprios limites e das muitas dificuldades que a vida atira para o caminho. A esse respeito, Alicia fala com a propriedade de quem não se limita a pregar esse evangelho. Sobrevivente a um cancro que, há cerca de um ano, a colocou frente a frente com a morte, esta desportista de toda a vida e triatleta de sucesso contou com a resistência própria de quem foi campeã nacional de basquetebol no CIF (1972), correu o primeiro “Iron Man” [triatlo de longa distância] realizado em Portugal, e já se sagrou campeã da Europa de veteranos (1999, Funchal) e vice-campeã europeia da mesma classe na Hungria (2001), além de um outro troféu, de vice-campeã europeia de ciclismo, também de veteranos, em 2003.

Também o marido, Bernard Verguet, foi um desportista competente, chegando a integrar uma equipa de voleibol da 3ª divisão francesa. Mas se, por um lado, foram os pais a dar a faísca nas duas meninas, ambos alinham no discurso realista. “O que interessa no desporto são os valores, o equilíbrio entro o esforço físico e os estudos”, sintetiza a mãe, acrescentando: “Têm de pensar no pós-carreira desportiva. Por isso costumo dizer-lhes que os resultados não interessam tanto, afinal tudo isto é efémero.” Bernard, o pai, concorda e frisa que, apesar de “viver intensamente” os sucessos das filhas, não os vive através delas: “Não sou aquele tipo de pai que se projecta nos feitos dos filhos. Ás vezes vejo pais de miúdos de futebol e faz-me impressão a atitude de alguns. O desporto é uma escola de valores, não tem outro sentido para mim.”

Vidas normais
Quando a família Verguet Moniz veio para Portugal, Sarah tinha 11 anos e Anais, 9. Preocupados com a adaptação das filhas a uma realidade completamente diferente, os pais colocaram-nas durante um ano no Liceu Francês e, paralelamente, continuaram a estimular a prática do desporto. Uma estratégia que Alicia repetia nas filhas, pois sabia, por experiência própria, quão importante pode ser a actividade física na socialização. “Quando tinha 8 anos e vim da Venezuela, foi o desporto que me ajudou a conhecer pessoas e integrar-me”, recorda Alicia Moniz.

As meninas foram inscritas na natação do Belenenses, e daí até à equipa de triatlo do clube do Restelo foi um pequeno salto, ajudado pela experiência que já traziam da escola de atletismo frequentada em França (Besançon Athlé).

Um percurso que levou a feitos vários, entre os quais se destaca, inevitavelmente, o titulo mundial de juniores conquistado por Anais em Gamagori (Japão), em Setembro do ano passado. Uma proeza vivida à distância, mas com grande intensidade por parte dos pais.

Futebol no caminho
“Estava em casa agarrada ao computador a tentar acompanhar a prova quando apareceu a Anais no “messenger" a avisar que conquistara o título mundial. E aí o computador foi abaixo.” O episódio, narrado pela mão, quase não acontecia se Anais tivesse cedido à tentação… do futebol.
Acontece que, a dada altura do seu treino, a mais nova das irmãs Moniz enfrentou alguns problemas na natação. Frustrada, foi alvo fácil para o convite de um dos treinadores das camadas jovens de futebol do Belenenses que, espantado com o talento demonstrado pela jovem nos jogos de bola com os amigos e o irmão mais novo (Miguel, de 11 anos), a convidou para integrar a equipa de futebol juvenil do Belenenses. Equipa masculina, sublinhe-se. “Andava um bocado triste e fiquei contente com a atenção”, confessa Anais que, todavia, foi a pouco e pouco reencaminhada para o rumo certo, muito graças ao trabalho dos treinadores Helena Kraieva e Slava Poliakov, dois técnicos russo do Belenenses. Um trabalho que terminou de forma feliz, com uma frase: “Mãe, sou campeã do Mundo!”

Caminhos de glória levam a França
O ano de 2006 traz consigo uma série de coincidências que parece configurá-lo com um ano de eleição para as manas luso-francesas. Assim, o campeonato da Europa decorrerá em Autun e o Mundial em Lausanne. Duas localidades equidistantes (150 km) de Besançon, cidade natal das duas atletas. Um eixo geográfico, mas não só, que suscita alguma emoção por parte das duas irmãs. “Vai estar lá toda a família, muita gente que conhecemos e não vemos há muito tempo, por isso vai dar-nos muito gozo”, confessa Sarah Moniz.
Mas existem outras coincidências envolvendo Besançon e o desporto português. Esta localidade da província francesa era também sede da equipa de ciclismo De Gribaldy, formação defendida em tempos por Joaquim Agostinho, campeão português do universo velocipédico e de Torres Vedras, ali bem perto de Sevilheira, onde a família Verguet Moniz está a construir uma casa de férias. Uma concidência que se espera traga sorte às duas irmãs para uma corrida “à Agostinho”.

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