terça-feira, setembro 06, 2005

Esperança

L.Rodrigues

Ontem tive esperança no Belenenses. Passando por Belém, junto à Torre de Belém, começo a ouvir o concerto da Mariza, fadista de inegável mérito e, nos dias que correm, o rosto mais internacional da sempre “internista” música portuguesa. Aproximei-me sem grande vontade de parar, eis senão quando reparo que, pura e simplesmente, não havia assistência. Ou por outra, havia algumas almas penadas espalhadas pelos magníficos relvados da Torre de Belém, num pequeno salpico de calor humano perante tamanha proeza musical.

Parei, recusei-me a acreditar que seria verdade! Aproximei-me, acompanhado da namorada e de um amigo, e connosco, éramos exactamente 25 espectadores a assistir, gratuitamente, ao concerto da Mariza. Impressionante. Foi nesse momento que me veio à ideia o nosso Belenenses, ainda capaz de arrastar alguns (poucos) milhares a pagar para assistir, por vezes, a espectáculos miseráveis, enquanto aquele deleite auditivo era presenciado por 25 almas…


Não estamos assim tão mal caramba! Bem sei que não houve uma divulgação massiva do concerto e o público português não é propriamente melómano. Mas estamos em Lisboa, uma urbe que nas suas largas fronteiras alberga mais de 2 milhões e meio de pessoas! Capital mundial do Fado, onde a cada esquina, em cada rua da Madragoa ou da Ajuda ainda se sente o cheiro do Fado. Desses 2 milhões e meio, só 25 tiveram interesse??? Caramba, e eu estava nesses 25, não que seja um apaixonado por Fado, longe disso. Não oiço Fado no carro ou em casa. Mas no dedilhar da Nossa guitarra, bate também o meu coração português (e porque não Belenense?), lamuriando-se das agruras da vida, congratulando-se com a bênção divina que é pertencer a este canto de paraíso chamado Portugal. As palavras, cantadas pela Mariza ou simplesmente “atiradas” por um qualquer “fadista” de esquina do Castelo, são as minhas palavras, são as palavras portuguesas. E eu não sou, de todo, um apreciador de Fado. Mas sou um apreciador do meu país, indubitavelmente. E, ao vivo, não perco uma oportunidade de ouvir Fado. Porque sinto o meu país a vibrar dentro de mim.

Parei, quando tinha já algo combinado, por pena. Porque vi na Mariza um jogador do Belenenses a marcar um golo genial para meia dúzia de pessoas na bancada aplaudirem. E fiquei porque, sendo apenas mais um, não era mais um numa multidão, mas sim mais um em somente 24. Por motivo de força maior, tive de sair. Fui todo o caminho até casa a pensar em que fenómeno aquele seria, capaz de levar 25 pessoas a assistir ao concerto da Mariza….

Chegado a casa, abro o jornal e descubro que afinal era o ensaio geral. Afinal era um treino. Ainda bem, até foi um treino concorrido. Aliás, que raio lhe teria passado pela cabeça para actuar de calças de ganga? De repente tudo fez sentido. Hoje, às 23:00, a Mariza terá, como merece, milhares de pessoas a aplaudi-la. Mas o Belenenses, o nosso Restelo, vazio, continua sem qualquer sentido. Cada jogo, um treino. Apenas um ensaio geral...

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