Entramos agora nos tempos a que já nos lembramos de assistir e que descrevemos com relativo pormenor quando desfiámos as nossas memórias pessoais. Por isso, tentaremos ser ainda mais sintéticos.
A década de 70 iniciou-se de forma venturosa para o Belenenses. Colheram-se os frutos do trabalho da Junta Directiva, como já disséramos no artigo anterior.
Comecemos pelo Futebol...
Na época de 70/71, Joaquim Meirim foi o primeiro treinador do Belenenses. Os resultados foram maus, e valeu-nos, a meio da época, o grande Homero Serpa, coadjuvado pelo Mourinho (pai). Mas, por outro lado, com as suas declarações bombásticas (talvez em parte demagógicas), Meirim teve o condão de provocar uma estrondosa mobilização dos “beléns”, de (re)acender a chama, a magia e o entusiasmo. O nosso estádio, que, na 2ª metade dos anos 60, se fora, comparativamente, esvaziando, voltou a encher-se de belenenses confiantes e quase eufóricos. Era uma loucura: 30.000 pessoas (ou mais) no Restelo contra o V.Guimarães ou o Tirsense (eu vi!)! O Estádio da Antas cheio com mais adeptos do Belenenses do que portistas, quando ali jogámos! Os resultados desportivos foram maus mas, financeiramente foi bom. E, passados todos estes anos, continuo a pensar se não podemos e devemos voltar a ter um golpe de asa que suscite esse entusiasmo e essa mobilização, embora, é claro, com outra solidez e com resultados desportivos mais satisfatórios.
Na época de 71/72, as coisas começaram a entrar nos eixos. Veio o consagrado treinador Zézé Moreira (que chegara a comandar a selecção do Brasil durante vários anos). A classificação final ainda foi decepcionante, um 7º lugar. Mas a verdade é que começámos muito mal o campeonato e à 7ª jornada, se não me engano, tínhamos 1 vitória e 6 derrotas. Ganhámos então ao Sporting por 2-1 (depois de estarmos a perder) - ainda me lembro de, miúdo, tremer de alegria - e, a partir daí, embalámos. Se contarmos as 19 jornadas desde a 7ª até à final (foi o último campeonato com 14 equipas e 26 jogos. Na ano seguinte fez-se um alargamento para 16, a fim de que a Académica permanecesse na 1ª Divisão. Honra seja feita ao Belenenses, que não quis beneficiar disso aquando da primeira descida, apesar de alguns o terem chegado a insinuar. O nosso não foi tão digno quanto peremptório! Como já disse, até o F.C.Porto já beneficiou desse tipo de favor, em 1939/40, ano em que, curiosamente, até viria ser campeão nacional!), se contarmos essas 19 jornadas, dizíamos nós, registámos um saldo bem favorável, com 10 vitórias, 7 empates e 6 derrotas. Também chegámos às meias-finais da Taça de Portugal. E, entretanto, os nossos jogadores mais jovens e promissores (por ex: Murça, Pietra, Quinito, Carlos Serafim), iam ganhando maturidade...
E foi assim que, na época seguinte, com alguns bons reforços, e a vinda de Scopelli para treinador, obtivemos um 2º lugar, um género de classificação de que há muito (mais de uma década) andávamos arredios. Depois, em 73/74, voltámos a realizar um bom campeonato, apesar de não termos ido além do 5º lugar. Ficámos atrás do Sporting, do Benfica, do V.Setúbal (que aqui culminou a sua década de ouro) e do F.C.Porto mas bastante próximos em termos pontuais - e, em contrapartida, com uma clara vantagem sobre o 6º classificado, o V.Guimarães, de 9 pontos (e no tempo em que as vitórias só valiam 2 pontos). A 1ª volta não foi grande coisa, e foi pena. Na verdade, acabámos a prova em grande, com 6 vitórias consecutivas; e, na 2ª volta, fizemos tantos pontos como o campeão. Se o campeonato tivesse durado mais umas jornadas, julgo que teríamos chegado ao 3º lugar.
Igualmente nas modalidades extra-futebol, e no domínio do património, se verificou um crescendo. Vejamos os principais factos e sucessos nos anos de 1971 a 1974:
971
1971 - Campeão de Lisboa, em Andebol. Campeão Nacional de Juniores, em Andebol. Campeão de Lisboa de Juvenis, em Andebol. Campeão Nacional de Ténis, em Equipas Femininas. Campeão Nacional e de Lisboa de Juvenis de Atletismo, em Equipas Femininas. Vice Campeão Nacional de Juniores de Atletismo, em Equipas Femininas. Campeão Nacional de Halterofilia. Alfredo Vaz Pinto, Campeão Nacional de Ténis. Leonor Peralta, Campeã Nacional de Ténis. Maria José Falcão presente no Campeonato Mundial de Ginástica Rítmica.
1972
1972 - Campeão Nacional e de Lisboa de Juniores, em Andebol. Campeão Nacional de Juniores, em Hóquei em Campo. Campeão de Lisboa de Juniores, em Hóquei em Campo. Campeão Nacional e de Lisboa de Infantis, em Ténis de Mesa. Campeão Nacional de Juniores de Atletismo, em Equipas Femininas. Campeão de Lisboa de Juvenis, em Equipas Masculinas de Atletismo. Vice Campeão de Lisboa, em Equipas Femininas de Atletismo. Campeão Nacional de Halterofilia, em Seniores e Juniores. Alfredo Vaz Pinto, campeão nacional de Ténis (7º título, 5º consecutivo). Leonor Peralta, Campeã Nacional de Ténis. Inaugurada a Sala de Troféus no Estádio do Restelo. Reconstruída a Bancada Nascente do Estádio do Restelo.
1973
1973 - Campeão Nacional de Râguebi. Campeão Nacional de Ténis, por Equipas. Leonor Peralta, Campeã Nacional de Ténis. Vencedor da Taça Ibérica, em Equipas de Ténis. Campeão Nacional de Juniores, em Andebol (de 11). Campeão Nacional de Juniores, em Ténis de Mesa. Campeão de Lisboa de Juniores, em Ténis de Mesa. Vencedor da Taça de Portugal de Juniores, em Ténis de Mesa. Campeão Nacional e de Lisboa de Juniores, em Equipas Femininas de Atletismo. Maria José Sobral presente na Taça da Europa de Atletismo, em Juniores. Basquetebol Feminino volta à actividade. Início da actividade do Andebol Feminino. Grande melhoramento da iluminação do Estádio, que se torna uma das melhores da Península Ibérica.
1974
1974 - Campeão Nacional de Andebol. Vencedor da Taça de Portugal de Andebol (na final, vitória 17-14 sobre o Benfica). Estreia na Taça dos Campeões Europeus de Andebol. Campeão Nacional de Ténis, por Equipas. Leonor Peralta, Campeã Nacional de Ténis (13º título). 1ª Equipa Portuguesa a participar na Taça dos Campeões Europeus de Ténis, atingindo a 2ª eliminatória. Campeão Nacional de Juniores, em Râguebi. Branca Seabra, Campeã Nacional de Corta Mato.
É importante salientar isto, porque fica claro que uma equipa de futebol competitiva não é incompatível com sucessos noutras modalidades, antes costumando ocorrer simultaneamente no nosso clube. Historicamente, pode-se demonstrar que, sempre que as coisas tiveram “picos” no futebol, o mesmo ocorreu no grosso das modalidades. Sei que é hábito pensar-se o contrário e que a nossa afirmação poderá ser contestada – mas a verdade é que os factos a justificam e fundamentam. E contra factos... Normalmente, quem pensa de maneira diferente, são as pessoas que (quase) supõem que a nossa história começou com José António Matias e que o nosso primeiro treinador foi Marinho Peres.
Gostava de salientar que o Presidente da Direcção, entre o início de 1972 e o final de 1974, foi o Major Baptista da Silva. Fez um excelente trabalho. Paradoxalmente, haveria de perder eleições, mais tarde: em 1990, directamente contra Ferreira de Matos / Cabrita (de cuja lamentável acção, depois, ainda teve que se esforçar por colar os cacos, juntamente com Agostinho Carolas, Florentino Antunes, Mendes Pinto e Luís Pires); em 1994, indirectamente contra J.A.Matias (na lista dos órgãos sociais do candidato Florentino Antunes). Os sócios, de modo absurdo, preferiram “enterrar o passado”, como os (tristemente) vencedores preconizavam. Os sócios não tiveram memória – como os que, hoje, continuam a achar inútil lembrar o nosso instrutivo passado, preferindo adular jogadores que, quem sabe, daqui a meses estarão noutro clube, a dizer cobras e lagartos do Belenenses. Os sócios escolheram o folclore e a falta de ambição – e Baptista da Silva, Presidente da Direcção quando o clube atingiu a melhor classificação futebolística dos últimos 50 anos, não teve oportunidade de voltar a ser Presidente. Triste...mas verdadeiro! Verdadeiro... e a reflectir! É fácil barafustar contra tudo e contra todos quando as “coisas” correm mal. Mas, e a nossa responsabilidade?
Quando as “coisas”, no Belenenses, pareciam voltar aos tempos de glória, deu-se o 25 de Abril. E, de novo, tudo se turvou no nosso clube. O receio da exprobação por causa do Almirante Américo Tomás deixou o Belenenses numa situação de grande indefinição. Enquanto alguns ousaram e deram grandes passos em frente (F.C.Porto, Boavista e até o V.Guimarães), e outros, que se poderiam sentir comprometidos (o Sporting...), não fraquejaram (João Rocha teve esse mérito), o Belenenses desinvestiu, ficou a marcar passo, assistiu a fugas - compreensíveis em alguns casos, lamentáveis, noutros. Logo em 1974, houve uma debandada de jogadores, como vimos em outros artigos. A época de 75/76 permitiu constituir outra vez uma equipa de grande nível (3º lugar), a que se seguiu nova debandada (para Benfica e F.C.Porto) – e o decaimento progressivo do Belenenses.
Não podemos de maneira nenhuma dizer que foi pena que o 25 de Abril tivesse quebrado um ciclo de progresso para o Belenenses, porque a importância daquela revolução para todo o país, desde logo ao trazer o precioso bem da Liberdade, não nos permitiria fazê-lo. Mas lamentamos, sim, que não tenha havido mais coragem e desassombro, até para lembrar que, se houve Américo Tomás e outros no Belenenses, o facto é que em todos os clubes houve figuras ligadas ao antigo regime; e que, em contrapartida, foram jogadores do Belenenses – e só do Belenenses! -, designadamente, Mariano Amaro, Artur Quaresma e José Simões, que se recusaram a fazer a saudação fascista aquando de um Portugal-Espanha. Ainda hoje, quem sabe disso? Quem sabe dos campeonatos de que fomos espoliados por arbitragens indecentes, nos tempos do regime em que supostamente éramos beneficiados? Quem sabe das raízes populares e até rebeldes do Belenenses? E, no entanto, ainda nos atiram à cara com Américo Tomás (que, sejamos justos, e fora de questões políticas, gostava deveras do clube, de que era sócio desde 1924, e nunca favoreceu o Belenenses - aliás, na prática, quem mandava em Portugal, durante a vida de Salazar, não era o Almirante, em nada). E infelizmente, poucos belenenses sabem ripostar, quando ainda hoje nos apontam o dedo, demagogicamente, os adeptos de clubes que, esses sim, em plenos regime democrático, são cumulados de benesses, privilégios e mordomias pelo Poder Central, Regional e Autárquico...
Como dissemos, o Belenenses ainda teve algumas épocas de fulgor logo a seguir a 1974. A 2ª metade do Campeonato de 74/75, foi boa (incluindo uma vitória 4-0 nas Antas, em 26 de Janeiro de 1975 e um triunfo 2-0 sobre o Sporting, na última jornada) e, na Taça de Portugal, atingimos as meias-finais; em 75/76, ganhámos uma das Séries da Taça Intertoto (o que significava ser “vencedor”!), ficámos em 3º lugar no Campeonato Nacional (invictos em casa), e conquistámos o 1º Campeonato Nacional de Iniciados. Em 77/78, tivemos uns bons primeiros 2/3 do Campeonato, no qual chegámos ao 3º lugar, a ameaçar os 2 primeiros. Mas, depois, começámos a caminhar para o abismo, com cada vez mais raros e fugazes sobressaltos.
As modalidades ditas amadoras acompanharam o ciclo, ou seja, aguentaram-se relativamente bem até 1978, decaindo nitidamente nos 3 anos seguintes. O mesmo aconteceu em termos de enriquecimento do património. Assim, entre 1975 e 1978, registe-se:
1975 - Campeão Nacional de Ténis, por Equipas. Campeão de Lisboa de Andebol Feminino. Campeão Nacional de Juvenis, em Râguebi. Campeão de Lisboa de Juniores, em Ténis de Mesa. João Sequeira presente no Campeonatos Mundial de Xadrez, em Juniores. Início das Obras do Pavilhão Gimnodesportivo
1976
1976 - Campeão Nacional de Andebol. Vencedor da Taça de Portugal em Andebol Feminino. Estreia na Taça das Taças em Andebol Feminino (1º clube português em Competições Europeias Femininas). Vencedor da Taça de Portugal, em Râguebi. Campeão de Lisboa de Juniores, em Basquetebol. Campeão Nacional de Iniciados de Atletismo, em Equipas Masculinas. Início das Obras do Pavilhão do Restelo.
1977
1977 – Campeão Nacional de Andebol (2ª vez consecutiva). 1ª equipa portuguesa a ganhar fora, e 2ª equipa portuguesa a atingir Oitavos de final em Competições Europeias de Andebol (Taça dos Campeões). Campeão de Lisboa de Juniores, em Equipas Masculinas de Atletismo. Campeão de Lisboa de Juniores, em Hóquei em Campo. Campeão Nacional de Juvenis, em Râguebi. Campeão Nacional de Iniciados, em Râguebi. João Sequeira, Campeão Nacional de Juniores, em Xadrez. Fernando Sequeira e João Sequeira presentes nos Campeonatos Mundiais de Xadrez, em Juniores. Inauguração do Pavilhão Gimnodesportivo (actualmente, Pavilhão Acácio Rosa).
1978
1978 - Vencedor da Taça de Portugal em Andebol. Vice Campeão Nacional, em Andebol. Estreia na Taça das Taças, em Andebol. Vice Campeão de Lisboa, em Hóquei em Campo. Campeão de Lisboa de Juniores, em Hóquei em Campo. Campeão Nacional e de Lisboa em Xadrez. Maria José Falcão presente no Campeonato Europeu de Ginástica Rítmica
Saliente-se, neste período, o grande e conturbado esforço para a construção do Pavilhão, de que também já falámos em outros artigos.
A partir do fim da década de 70, pessoalmente, sentia no Restelo um ambiente de laxismo, de porreirismo, de amolecimento. Ainda havia o ambiente à Belenenses mas esbatido, acinzentado, amolecido. Não vou culpar os dirigentes, porque eles terão feito o melhor que podiam e porque eram belenenses a sério. Falo, antes de tudo, dos comentários nas bancadas: de “apalhaçamento”, de optimismo parvo, de perda de mística – embora nada que se compare com o triste cenário de hoje. Tudo “cheirava” a enfraquecimento. Vendíamos os melhores jogadores e, mesmo assim, só se falava de dívidas, de cada vez mais dívidas. Nunca, porém, acreditei que descêssemos de divisão, como veio a acontecer em 1982. Já falei disso, logo num dos primeiros artigos desta série. Ficámos incrédulos, muitos de nós. Acontecera o que... não podia acontecer!
E agora, falo para os mais jovens. Muitos de nós assistimos ao último jogo dessa época de lágrimas nos olhos, ouviram? Não nos conformávamos, não podíamos aceitar que fosse normal – como mais tarde quase se passou a achar. Discutia-se acaloradamente ao pé do monumento ao Pepe! Sim, durante anos, antes dos jogos começarem e, sobretudo, depois deles, e até nos dias de semana, ficávamos ali às centenas – muitas centenas – a discutir acaloradamente o nosso Belenenses. Não era a debandada triste de hoje, a debanda dos poucos que resistem. Quando o Belenenses desceu a primeira vez, esse acontecimento foi de grande impacto nacional. Fez a primeira página em todos os jornais, desportivos ou não, foi abertura de noticiários, ouviram? Nós somos um clube de tradição! Não somos, com o devido respeito, o Rio Ave ou o União de leiria, o Boavista ou o Penafiel. A nossa bandeira está encharcada de lágrimas! A nossa camisola foi honrada com sangue, suor, sofrimento, pertinácia, querer e paixão! O Belenenses teve grandes dirigentes, teve grandes jogadores, teve adeptos enormes, páginas e páginas escritas a letra de ouro no livro dos feitos maiores e mais nobres do desporto português.
O nosso clube merece respeito – antes de tudo, por parte dos seus adeptos. Não nos façamos, nunca, de coitadinhos – tudo menos isso!
1 comentário:
entao fala-se do belenenses é blog e mais blog e de inácio rebelo nada,se calhar nao era má ideia falar e valorar o trabalho deste homem que deu tanto ao belem e ate foi campeao nacional nao ficava nada mal, nao acham?
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