Por estranho que possa parecer, a última alegria realmente muito grande que o Belenenses nos deu, a conquista da Taça de Portugal em Maio de 1989, abriu a porta para o regresso à tristeza. Claramente, como já escrevi, não houve força ou ambição para ir mais longe, para continuar a ressurgir. Desinvestiu-se, e a época seguinte, a de 89/90, já representou um passo atrás. Depois, não houve nenhum festejo organizado dessa vitória, nem ela foi minimamente explorada, em termos psicológicos, para criar mais elán, como se impunha. Essa indiferença aos factores psicológicos – sobretudo o quase horror à psicologia das massas – é algo de tristemente continuado no Belenenses. Mais tristemente ainda: quando se fala nisso, são muitos os adeptos que se não interessam, que permanecem indiferentes, que acham que essa questão não merece um comentário. E assim, infelizmente, tal é ignorado nas candidaturas eleitorais.
Repito: depois da vitória na Taça, o Restelo parecia estar em hibernação. As assistências diminuíram drasticamente, porque não havia chama. Já antes escrevi isto mas repito porque vejo a insistência no erro de que o aumento da presença de público no Restelo é (ou será) basicamente uma consequência de bons resultados. É falso. Os factos mostram uma coisa diferente.
Bom, mas o pior estava para vir. Na sequência da já por nós repetidamente explicada vitória de Ferreira de Matos (excelente mas completamente inadequada pessoa) nas eleições de 1990 (péssima escolha dos sócios), o que restava de esperanças de reassunção da grandeza do Belenenses iria esboroar-se completamente. Nunca conseguirei perceber como é possível que, um ano depois da vitória na Taça de Portugal, os sócios tenham optado pela falta de ambição e pelo folclore menorizante. Mas enfim... As más escolhas pagam-se; e o preço foi a descida de divisão, um mar de dívidas, a entrada no anedotário nacional. Mas ainda há gente que olha as eleições com ligeireza e que, embora pense o contrário, estaria pronta para votar num Ferreira de Matos ou num Matias! Tenho a absoluta convicção disso! Ainda bem que não se perfila nenhuma candidatura assim para as próximas eleições. Caso contrário, seria vitória quase certa....
Foi talvez o maior golpe que nos auto-infligimos na história do Belenenses. A partir daí, não mais se podia sustentar que tínhamos descido (só) uma vez, por acidente. A partir daí, descer (ou não) passou a ser um facto para se lidar habitualmente! A partir daí, cada vez mais se multiplicaram os ignorantes da história do clube – e pior do que isso, que fazem gala em a espezinhar -, prontos a estarem de joelhos perante os nossos 3 velhos rivais (por causa de um Paulo Sérgio ou de um Rodolfo Lima, por exemplo) e a assanharem-se com o Penafiel ou o Gil Vicente. Às vezes, verifico, com espanto, que há gente que parece preferir que estivéssemos a lutar pelos 1ºs lugares...de uma divisão secundária!
O que restava da alma do clube ainda teve um sobressalto. Na histórica Assemblei Geral de Dezembro de 1990, num erguer de braços unânime, os dirigentes foram destituídos e eleita uma Junta Directiva, liderada pelo Major Baptista da Silva. Foi já tarde para evitar a descida de divisão mas a acção da Junta foi meritória e veio trazer um balão de oxigénio ao Belenenses.
A fim de garantir o retorno imediato à 1ª divisão, a equipa foi reforçada com jogadores de qualidade (Emerson, Mauro Airez, Luís Gustavo). Pôs-se, naturalmente, fim, à experiência dos empréstimos do ano anterior. Depois de um mau começo, a equipa embalou no 2º terço do Campeonato, agora com Abel Braga a treinador, e assegurou a subida.
A época de regresso começou com bastante fulgor, excelente futebol e boas assistências; e o regresso às competições europeias esteve por um triz. Seria ainda possível um ressurgimento do Belenenses?
A época seguinte, com três treinadores – Abel Braga, José António e José Romão – traria a (de qualquer maneira previsível) negação dessa hipótese. Entretanto, ao Presidente António Moita, de boa memória, sucedera Luís Pires, sem dúvida um belenenses de gema e com vontade de singrar mas muito instável, ou seja, sempre a mudar o plantel da equipa de Futebol. Na sua Presidência, fica, no entanto, o registo de mais um título – o 5º - de Campeão Nacional de Andebol, cuja última jornada teve lugar em Março de 1994.
Apesar de tudo, entre a 2ª metade de 1992 e a 1ª metade de 1994, o Belenenses viveu uma breve Primavera. Vejamos de que modo isso se reflectiu nas modalidades extra-Futebol:
1992 - Campeão Nacional de Juniores, em Pólo Aquático. Campeão Nacional de Ténis, em Veteranos. José Pinto presente nos Jogos Olímpicos pela 3ª vez.
1993 - Vice Campeão Europeu de Triatlo, por Equipas. José Mariz, Campeão Europeu de Triatlo. Campeão Nacional de Juniores, em Râguebi. Vencedor da Taça de Portugal de Juniores, em Râguebi. Vitória na Taça Ibérica de Râguebi, em Juniores. Campeão Nacional de Hóquei em Campo. Campeão de Lisboa de Infantis, em Hóquei em Campo. Campeão de Lisboa de Juniores, em Hóquei de Sala. Estreia na Taça da Europa de Bilhar às Três Tabelas. Campeão Nacional de Ténis, em Veteranos (7ª vez consecutiva). Campeão Nacional de Patinagem Artística, por Equipas. Rita Falcão, Campeã Nacional de Patinagem Livre. José Pedroso, Vice campeão Europeu de Lançamento do Martelo, em Veteranos. Joana Serpa presente nos Campeonatos do Mundo de Ginástica Rítmica.
1994 - Campeão Nacional de Andebol. Campeão Nacional de Juvenis, em Râguebi. 2ª vitória consecutiva na Taça Ibérica de Râguebi, em Juniores. Vice Campeão Nacional de Juniores, em Corta Mato.
Acresce a isto um dado muito significativo que foi – finalmente! – a conclusão e inauguração das Piscinas.
Estalou entretanto, na Primavera de 1994, uma crise directiva no clube, digladiando-se os que preconizavam uma política de contenção financeira e os que apostavam em maior investimento. Dessa crise, sobre a qual tenho uma opinião muito peculiar, que não vem ao caso, resultou a convocação de eleições.
E não é que a maioria dos sócios repetiu exactamente o mesmo erro que 4 anos antes? José António Matias sobe à Presidência e, como 1º acto – já anunciado como carácter distintivo da sua lista, face às outras candidaturas – vende Emerson, o nosso melhor jogador, ao F.C.Porto. Em contrapartida, nessa época, tivemos 4 jogadores emprestados. Salvámo-nos da descida na penúltima jornada, sob fortes suspeitas de métodos reprováveis. A equipa médica e o grande João Silva, Belenenses de décadas são marginalizados. Que falta de respeito (a mesma que levou J.A.Matias a nem estar presente no funeral de Acácio Rosa)! Pelo meio, as habituais cenas rocambolescas nas candidaturas e direcções folclóricas: por exemplo, José Romão é despedido mais ainda dirige a equipa mais um ou dois jogos (e se tivesse ganho), enquanto a Direcção espera que ele também assuma a vontade de sair, por causa das indemnizações. Sucedeu-lhe João Alves.
Este último tem uma qualidade que não podemos deixar de reconhecer: a de descobrir talentos. E isso teria sido bom para o clube, época seguinte, a de 95/96, não fosse uma série de mas e de ses. E vem então um dos extremos em que o Belenenses tem sido fértil nas últimas décadas (desinvestimento / investimento excessivo): compraram-se jogadores às carradas, alguns completamente desnecessários (como foi o inqualificável caso de Pacheco que, aliás, pelo que dissera no passado, jamais se deveria admitir que vestisse a nossa camisola. Mas quando não há sentido de dignidade...). José António Matias, talvez mal acompanhado e sem habilidade para dizer “não!”, põe o clube (e a ele próprio, sejamos justos) à razão de juros. Assumamos as nossas responsabilidades: 1º) foram os sócios que elegeram aquela Direcção; 2º) Se houvesse uma maior resposta em termos de presença nos jogos, em termos de base de apoio (correspondendo à qualidade do plantel), talvez as coisas pudessem ter sido diferentes. O final da época é um autêntico dilúvio: não se vai além do 6º lugar no Futebol, o clube está mergulhado em dúvidas, a maior parte dos nossos jogadores são vendidos ao desbarato (pergunta inocente: não houve nenhum “grande” belenenses, daqueles que prometem mundos e fundos, que permitisse aguentar a venda de um, dois ou três desses jogadores, que nos poderiam ter trazido larguíssimos proventos)?
Matias sai, deixando o clube e a si próprio em maus lençóis. Devemos ter o sentido de gratidão e de justiça de reconhecer o seu papel na conclusão das piscinas, quando era Vice-Presidente. Não duvido de que quisesse o melhor para o Belenenses.
E recomeça a luta pela sobrevivência. Há que fazer face à avalanche de dívidas que surgem de todo o lado. Em 96/97, parecia que era possível, mesmo assim, aguentar a equipa de Futebol entre os maiores. Mas, na época seguinte, já com Ramos Lopes a Presidente, a penúria do plantel, algumas arbitragens vergonhosas (por exemplo, o tristemente célebre jogo com o Benfica, no Restelo, em que perdemos 2-1 mas com... um dos “golos” do Benfica a resultar de um lance em que a bola não entrou (!!!); o outro marcado num fora de jogo aí de 10 metros) e a aparente opção deliberada de descer aos infernos para sanear o clube e recomeçar, empurraram-nos para a descida.
Foi na 2ª divisão que se reforçou a equipa a sério (criando-se, aliás, uma base defensiva para muitos anos: Marco Aurélio, Filgueira, Tuck, a seguir Wilson e Cabral). Houve mérito do injustiçado Cajuda, que fez uma prospecção de jogadores muito séria; e houve um verdadeiro esforço directivo para adquirir bons jogadores, e com uma política consistente. E isto leva-me a perguntar: porque raio é que só quando descemos é que há esse esforço para melhorar muito o plantel (91 e 98)? Será porque então se propõe um objectivo (a subida) enquanto nos outros anos é o “deixa andar”, “qualquer coisa serve”? Um grande mistério – ou talvez não...
Os últimos 5 anos estão frescos na memória de toda a gente: melhoria das instalações, recuperação financeira, sucessos em várias modalidades extra-futebol (aspectos positivos); futebol sem objectivos realmente ambiciosos (apesar de uns fogachos nas épocas com Marinho Peres e do quimérico anúncio do objectivo 4º lugar na época passada), diminuição progressiva das assistências, continuação da perda de identidade do clube (aspectos negativos).
Dia a dia, o Belenenses vem perdendo visibilidade, em parte, é verdade, por causa de uma Comunicação Social cada vez mais discriminatória, que quase só fala em 3 clubes; mas, em grande medida, porque os dirigentes nunca implementaram nem os sócios (que tendem sempre a repetir os clichés vigentes) exigem uma política de Imagem e Projecção.
Nesse aspecto, o Belenenses está por um fio. Não sabemos quando já será tarde de mais. Até os próprios sócios já desconhecem ou, mais incrível ainda, querem enterrar o peso da nossa história; a alma do clube está moribunda. Admitimos tudo, até as maiores humilhações, sem já termos noção de que são humilhações. Ou mudamos a sério... ou o Belenenses caminhará cada vez mais para um clube vulgar, sem identidade nem ambições. Mesmo que façamos um fogacho numa época futebolística, que adiantará isso com assistências de 2 ou 3 mil pessoas?
Belém, acorda! Não deixes que (os) outros te condicionem e determinem o que deves pensar (para tua própria desgraça). Não te deixes embalar, numa dormência fatal! Não deixes morrer a tua alma! Lembra-te do que foste, para saberes o que deves ser no futuro!
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