A propósito da questão, em que muito temos insistido, das fracas assistências aos jogos no Restelo, das razões que lhes dão origem e das medidas a implementar para revolver a situação, ocorre-me parafrasear uma frase que, na primeira eleição de Bill Clinton para a presidência americana, ficou célebre – “É a economia, estúpido!”.
No meio das várias razões geralmente apontadas para a pouca presença de público nos últimos anos – desde os maus resultados às más exibições, desde o preço dos bilhetes aos horários dos jogos, desde as más arbitragens às transmissões televisivas – escapa uma que, a meu ver, como tenho várias vezes afirmado (mas, pelos vistos, não sendo levado a sério!!!), é a mais forte de todas. E não é para insultar ninguém (mas antes com um humor que espero não seja ofensivo) que vou buscar a referida frase, trocando “economia” por AMBIENTE, mas sim por me sentir quase exasperado por se ignorar essa causa, e se apontar uma infinidade de outras, que considero muito menos relevantes. Pior ainda, em outros casos: por se encolher os ombros, com indiferença, ou com o sentimento conformista de que não há nada a fazer…
Este artigo tem uma natureza especialmente controversa. Por isso, gostava de reafirmar que os pontos de vista e afirmações nele contidas, somente a mim responsabilizam.
É fácil e imediato dizer-se que são os maus resultados que afastam o público – mas essa afirmação resiste aos FACTOS OBJECTIVOS? Podemos demonstrar que não é linearmente assim! É verdade, sem dúvida, que bons resultados entusiasmam e maus resultados desanimam, e que isso se reflecte na presença de público... Mas há muitos “ses” e “contudos”. E, em última instância, esse condicionalismo tem força menor do que outra causa mais profunda, ligada mais radicalmente à identidade do clube e àquilo que, em cada momento, ele projecta de si.
Vamos a FACTOS. Em 1987/88, o Belenenses obteve a última presença no pódio nos últimos 30 anos, com Marinho Peres a treinador. E o que aconteceu às assistências, nessa época? Pois, BAIXARAM! E BAIXARAM BASTANTE! Quando na jornada anterior obtínhamos um resultado mais moralizador, a assistência subia uns 10% face ao jogo anterior MAS continuava a ficar em pouco mais de metade da época anterior!
Marinho Peres foi, sem dúvida, o treinador mais bem sucedido no comando do Belenenses desde há 30 anos (justificando o nosso respeito e carinho) mas o facto é que, com ele, as assistências nunca subiram – pelo contrário, desceram em flecha (1ª presença) ou continuaram a descer (2ª presença). E porquê? REPAREM QUE ISTO DESMENTE A TEORIA “MELHORES RESULTADOS, MAIORES ASSISTÊNCIAS”.
Porque é que isso sucedeu? Tanto quanto podemos perceber, porque o ambiente que o clube transmitia, que projectava de si, é um ambiente de “mornice”, de “não fazer ondas”, de “os outros grandes” (que nós já não somos…). Porque o clube não teve causas mobilizadoras e que preservem e “gritem” a sua identidade. E pergunte-se aos velhos grandes Belenenses, alguns que se vão afastando desanimados e impotentes, se não é dessa alma que sentem falta – e não duvidem que, numa grande maioria, dirão que sim. É essa desistência da identidade orgulhosa do clube, é esse quase medo de ser popular, é essa aversão a ser desafiador e rebelde COMO ERAM OS RAPAZES DA PRAIA (os fundadores do clube), É ESSE ABURGUESAMENO COMODISTA a causa da doença que mina o clube e que tantas vezes afasta, repudia ou até persegue OS MELHOES, OS QUE MAIS CONHECEM E SENTEM O CLUBE!
E esse ambiente está presente quando somos atropelados (veja-se o caso do jogo nas Antas) e calamos; quando nos vergamos aos nossos antigos rivais e lhes chamamos os grandes (e não “outros grandes); quando, desnecessariamente, lhes insistimos em pedir jogadores emprestados, para os colocarmos (a esses públicos), diante da opinião pública, no conceito de “beneméritos amigos” e lhe darmos ainda mais tempo de antena… (perguntem aos que fizeram os grandes feitos da vida do Belenenses e que ainda estão vivos o que acham dessa prática, ou de alianças com o Benfica e o Sporting, e ficarão elucidados… De quem será mais válida a resposta: dos que fizeram grande o clube ou de outros “inventores”? Dos que fizeram a originalidade do Belenenses, LIVRE, INDEPENDETE E OUSADO, ou dos que logo retorquem que vamos fazer assim porque “o Braga, o Marítimo, o Guimarães e o Boavista” também o fazem e portanto… Como se nós fôssemos iguais a eles! Como se nós quiséssemos ser o BOAVISTA II em vez do Belenenses! Como se nós tivéssemos que copiar esses exemplos, quando os não copiamos no que porventura se justificaria… Lutarei contra isto, mesmo correndo o risco de parecer chato, de criar antipatias, de ouvir piadas e remoques, de ser acusado de demagogo e irresponsável, porque entendo, e entenderei até alguém me apresentar argumentos do contrário, que isto mancha a nossa camisola, a nossa honra, a nossa auto-estima, a imagem que projectamos de nós, o respeito a que nos devíamos dar, e por isso é co-responsável por comprometer o futuro do clube; porque entendo que isso contribui para nos retirar espaço vital, para alimentar a psicologia dos coitadinhos, para nos adormecer e nos roubar o que nos resta de ambição...mais uma vez a questão do AMBIENTE que se respira!).
E esse ambiente está presente quando, no meio de um jogo potencialmente mais excitante, há ocupantes das bancadas dos sócios que discutem o Benfica e o Sporting e nem reparam que com um pouco mais de incitamento, com esse “empurrão”extra, a equipa “entraria” com a bola pela baliza dentro; quando se experimenta baixar o preço dos bilhetes mas, 2 ou 3 dias antes, ninguém, no público, sabe de nada (será que é esperado que se adivinhe? Que as pessoas passem todos os dias pelos serviços administrativos do clube?); está presente quando, em vez de se oferecer algo que dê calor, alegria e colorido às bancadas (bandeiras, lenços azuis), se oferece… um porta-chaves; está presente quando se fala em iniciativas para “dinamizar o povo azul” e se afirmam medos de “populaças e gritarias”.
E volto aos factos… FACTOS, repito! Em 1989, o Belenenses venceu a Taça de Portugal. E na época seguinte, logo nos primeiros jogos, logo no jogo de apresentação, sabem O QUE ACONTECEU? As assistência desceram a um nível mais baixo do quem qualquer outra época no Restelo!!! E porquê? Passo dos factos para a minha interpretação que, porém, nunca vi contraditada a partir de factos: porque logo a seguir caiu sobre o clube, ou melhor, saiu do clube, de muitos dos seus dirigentes e passando para (alguns) adeptos – e vice-versa -, um sono paralisante feito de conformismo, de inércia, de falta de ambição “(isto já foi muito, agora recolhamo-nos ao normal…”), de pseudo-pragmatismo conservador, ainda que envernizado por tiques de eficácia, de subalternização face a outros clubes – anunciada quando logo se disse que tinha sido um feito excepcional e episódico (devido a Marinho Peres!!!) mas que continuávamos no nosso lugarzinho e selada com o pedido de empréstimo de Edmundo ao Benfica (embora em condições menos gravosas do que as vigentes nos tempos de Ferreira de Matos/Cabrita e Matias, campeões entusiasmados dos empréstimos, embora se finja que não se repara sempre que falo no inconveniente facto…). Triste e paradoxalmente, deixou de haver objectivos, algo por que lutar, por que cerrar os dentes, por que afirmar a alma e identidade do clube, algo que (nos) toque, que nos galvanize, que nos chame a reunir – nem que seja para resistir uma vez mais, para lutar contra a adversidade, uma vez mais, para reconstruir, uma vez mais…
Em resumo, e portanto, é preciso baixar os preços, até ao ponto de encontro das curvas da oferta e da procura, em que, para a mesma receita, se maximize o número de espectadores; é preciso tentar os melhores horários possíveis para a realização dos jogos; é necessário publicita-los adequadamente, em especial aos mais importantes, e fazer conhecer as condições favoráveis (ofertas, preços para acompanhantes, etc.); é necessário ter um projecto coerente para a equipa de futebol, que não se esgote no imediatismo de uma época, e que permita que, no futuro (próximo), se volte a bons resultados. Tudo isto, sem dúvida! Mas é preciso “cuidar do ambiente”: é preciso recriar a mística, ter objectivos, suscitar entusiasmo, potenciá-lo, criar ambiente no jogo e à volta do jogo, no Estádio e à volta do Estádio, reafirmar a componente popular do Belenenses, afirmar uma cultura de massas, de multidão, de envolvimento da equipa – fazendo perceber que o clamor, que o aplauso, que o incentivo, que o colorido dos cachecóis e das bandeiras, que a presença multitudinária, distribuída pelo estádio (em vez de se correr para camarotes e espaços privilegiados onde não se dá pela presença das pessoas...), tudo isso contribui para triunfos, tudo isso é a nossa contribuição para o clube, bem mais importante do que, para os sócios, uma simples quota.
É preciso, enfim, restaurar o orgulho e a maneira ousada e original de ser belenenses!
Nunca fui capaz de me confinar à retórica, à simples teorização sem prática, às boas intenções, ao sermão estéril. Por isso, também é que não aceito o comentário “fala-se, fala-se, mas iniciativas, nada!”.
Por isso, volto a lançar a ideia, para o jogo com o Benfica, agora com antecedência e alargadamente: uma hora antes do jogo com o Benfica, 2 ou 3 locais de concentração, de onde partamos, EM CONJUNTO, para alegrar e “redespertar” para o azul as ruas de Belém: o Núcleo Ajuda/Belém, os Pastéis de Belém e ainda algum outro local que alguém queira sugerir. Depois, 40 a 45 minutos antes do jogo, a partida para o Estádio. Não serei eu, como se fosse uma questão pessoal, a insistir com a ideia: espero que nela se pegue – mas já! Se assim for, cá (lá!) estarei com todo o entusiasmo. Espero que desta vez não haja “desculpas”: foi muito em cima da hora, estava a chover, tenho que levar o carro…Mas, se houver tais desculpas, por favor, depois, não se diga que não se faz nada, que é só conversa – a não ser que seja uma autocrítica!
(Gostava de deixar uma nota para o bloguista Rui Antão, cujos comentários por vezes tenho apreciado, pela sua pertinência e lucidez. Não, não me chocam nada projectos empresariais fortes a reforçar a componente financeira do Belenenses; como não me choca, antes preconizo, a profissionalização de funções agora ainda só remetidas para a boa vontade – ou a ausência de vontade – que, depois, dificilmente pode ser responsabilizada. Quando falo contra uma lógica PURAMENTE empresarial, quero dizer isto: um clube descaracterizado como o Belenenses, tem que reafirmar os seus ideias clubísticos, e à sua luz definir os grandes princípios e objectivos, e isso está além de um, simples cálculo de receitas e despesas; na fase da execução, então sim, mas subordinadamente, é necessário o rigor e a eficácia e pragmatismo de tipo empresarial. Em resumo: não se confunda a alma de um clube com o simples calculismo empresarial, quando se trata das grandes coisas; não se metam considerações pessoalistas ou de folclore pseudo-clubístico, onde é necessário que “falem” factos, números e estruturas).
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